31/03/2014

True Detective: entre o niilismo e a esperança




Rust Cohle – a figura interpretada de forma brilhante por Matthew McConaughey em True Detective – é, no fundo, um sujeito esperançoso. Mesmo que tenham chovido comentários estabelecendo a relação com o pessimismo de Cioran ou Schopenhauer – a coisa não é por aí. As falas da personagem ao longo da série, como a já célebre e clássica cena do carro, podem até sugerir desesperança, mas as ações e trajetória de Rust nos mostram um homem em busca de um consolo. E que tem esperanças de encontrá-lo. 

É um sujeito que foi castigado – sem razão – e ainda tem senso de justiça. Resiste ainda em sua integridade, como Jó. Nesse sentido, há uma certa religiosidade trágica nessa primeira temporada da história criada por Nic Pizzolatto.

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Produtor/roteirista Nic Pizzolatto e o ator Matthew McConaughey,
Photo by Frederick M. Brown


"Eu não gostaria que qualquer telespectador entendesse que estamos propondo uma agenda niilista, ou reduzisse Cohle a um anti-natalista niilista. Cohle é mais complicado do que isso. (...) Ele é muito apaixonado, também muito sensível, se preocupa demais para ser rotulado como um simples niilista. (...) Quando Cohle fala do indizível, não é com a mesma perspectiva ilusória com que Hart fala sobre a importância de ter regras e limites?". 

Nic Pizzolatto, roteirista e criador da série, em entrevista ao blog Speakeasy. 

Algumas referências citadas por Nic Pizzolatto: Cioran, Poe, Thomas Ligotti, Laird Barron, John Langan, Simon Strantzas, Robert W. Chambers.

Só conheço Cioran e Poe. Dos outros, nunca ouvi falar.

Pelo sucesso repentino da série, a Intrínseca está preparando uma tradução inédita de O Rei Amarelo de Robert W. Chambers.

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Mas eu falava do Rust. Que é um cara com o coração cheio de esperança. Isso fica claro não apenas pelo diálogo final, quando relata uma espécie de encontro – ou desejo ou esperança de – com a sua filha morta. Não apenas pela metáfora com o céu. Ao longo da série ele acorda de manhã, vai trabalhar, passa anos investigando um caso sozinho. Não parece a postura de um pessimista. Claro que uma análise psicológica mais rasteira pode dizer que esse estado obsessivo é uma tentativa de suprir a carência da filha. Mas aí estamos no nível dos desvios comportamentais. E desvios de comportamento nada têm haver com pessimismo ou niilismo.

Se comparamos Rust com o professor de peça The Sunset Limited, de Cormac McCarthy, por exemplo, fica claro que o detetive mais querido do momento é um sujeito até simpático. Rust é um sujeito que, incapaz de contemplar o vazio, a dor e a indiferença do mundo tal e qual, ao invés de saltar na linha do trem – salta no Absurdo. É um homem que acredita em um mundo melhor. É preciso imaginar Rust feliz.

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