10/08/2010

Memória empírica de um cárcere de infância.

Você pode ouvir o zumbido e está perto o bastante pra ver as minúsculas fissuras nos olhos, duas pequenas esferas oleosas prensadas contra o triângulo invertido mal planejado, a cabeça (mas que de perto, como você está agora, transfigura-se numa grande caixa, talvez de madeira, construída as pressas por um marceneiro preguiçoso, marteladas lentas e desencontradas, portador de um esquadro empenado). As antenas, de perto, onde você está, não são propriamente antenas, filetes miúdos e frágeis prestes a quebrar em razão de um sopro mais forte ou acasalamento; todavia, como dois vergalhões 10,0 mm eretos e bambos e que, por estarem fixos, eretos, bambos e soltos, são indestrutíveis (ou assim se apresentam e você acata a sugestão). Com as asas recolhidas, junto ao tronco, de perto, onde você está agora, é inevitável não se admirar diante do relevo que acompanha os traços na superfície semitransparente ou azul, vermelha, verde; feito papel celofane camaleão cambiando cores conforme ângulo, distância, altura do observador, escambo sem fim. Cada olhar tem um tom a oferecer aos objetos. Um pouco daquilo que são ruas, avenidas, fábricas e prédios da grande cidade vista do céu ou a extensa plantação de milho vista da janela de um avião em vôo doméstico. Da janela do avião, inversamente proporcional, a extensa plantação de milho lembra as asas daquele gafanhoto que você aprisionou num vidro de maionese, sem julgamento ou direito de apelação, por necessidade empírica e autoridade científica, que só as crianças têm. E vez ou outra, ao sacar a tampa laranja do vidro, o cheiro era forte; cheiro alguma coisa não está certa, ausência de ar e de espaço, cheiro das coisas quando mortas. 

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2 comentários:

  1. Marcos, na infância de todos sempre existiu um cientista. Eu colocava vaga- lume em vidros de conservas.

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oi.