16/11/2011

Sobre sinais, digestão, chuva e bombinhas no recreio





Porque aconteceu muita coisa bonita nesses últimos dias. Eu queria escrever uma coisa bonita agora. Mas eu sei dos meus limites. Logo atravessaria a linha da ternura e cairia na fenda do ridículo, como nessa frase que acabei de escrever. 

E queria frases que estalassem feito bombinhas no recreio, debaixo de tijolos e latinhas de milho-verde voando enfumaçadas pro alto, cheirando a pólvora vagabunda e repicando sete vezes nas pedras do pátio.

Alguma coisa que farejasse o ruído da chuva quando desce sobre as pedras, lavando a areia. 

Alguma coisa sobre quebrar ovos. Perder o ônibus porque um outro ônibus quebrou na chuva.

Dizer que há uma lição ou um sinal nisso tudo (não podemos controlar tudo).

Mas não é bem isso. Não é nada de lição ou sinal pregado no céu, você sabe.

Nada de minutos de sabedoria, se bem que a gente não pode evitar.

Só aprender a calar. É o segredo de quase tudo na vida. O complicado é acertar na afinação do silêncio.

E acho que os grandes caras que conheci nessa vida, não são aqueles que têm algo a dizer sobre tudo. 

São aqueles caras que sabem calar na hora certa. E com estilo, é claro.

Nada mais óbvio.

Aconteceu de um cara me cercar na beira do balcão e falar que encontrou uma carta que escrevi pra ele mandar pra uma namoradinha dele há uns 15 anos atrás. E o cara me disse que usou aquela mesma carta por anos. Cambiava apenas os nomes das mocinhas e mandava.

Tenho pra mim, que deve ser a coisa mais bonita que já escrevi na vida. 

A coisa mais útil, pelo menos. 

Porque o cara disse que a carta sempre funcionou pra todas as meninas que ele mandou.

E pra menina que eu mandei (pra menina que tinha me impulsionado a escrever aquilo), a carta nunca funcionou.

E talvez tenha sido esse cômico desastre a me ensinar desde cedo que escrever não muda nada no mundo. Não corresponde a demandas senão aquela demanda mesma que a gera. Sem mais.

Afinal, o que ganha o sol se autoaniquiliando por si mesmo com a constante demanda de tristes poemas mal escritos?

Quando muito, um retrato falso e malacabado.

Ainda bem.


Aconteceu da gente tomar uma chuva tenebrosa no alto da serra, você se lembra?

E as meninas ainda tentando terminar de fazer a carne na chapa, enquanto todo mundo juntava as coisas. Depois, eu fiquei reparando meu amigo escalando a trilha com o filho nas costas, reparando na hora que ele pegou uma toalha, jogou sobre o corpo do menino, miúdo, os cabelos ensopados, escalando. E descalço, porque ele não podia molhar o tênis, ia jogar bola mais tarde.

E sabe que tinha alguma coisa muito bonita ali, naquela chuva caindo sobre eles ali no meio daquela serra? Mas não disse nada a você. Não disse nada, porque talvez eu achasse que o legal era não dizer. 

Nunca é fácil construir diálogos interessantes, principalmente na realidade. 

Mas tinha alguma coisa, uma dessas coisas que não dá pra dizer. Dessas coisas que talvez você, eu, todo mundo sente exatamente o que é.

Não se explica. E não precisa explicar pra funcionar ou entender.

Como respirar. Ou digestão. Alguma coisa assim.


6 comentários:

  1. Digeri. Parabéns.

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  2. "O complicado é acertar na afinação do silêncio."

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  3. vc QUERIA escrever uma coisa bonita??? pára, né, velho... Senti o cheiro da chuva, se quer saber. Q ódio!

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  5. Escrever pode não mudar o mundo externo ao leitor...

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  6. "E talvez tenha sido esse cômico desastre a me ensinar desde cedo que escrever não muda nada no mundo. " Eita, que muda sim heim! A gente é que não consegue capturar direito onde tudo isso reverbera no outro. As vezes nada, as vezes muito. Resta a nós apenas "essa pequenina luz indecifrável
    A que às vezes os poetas dão o nome de esperança." (Vinicius de Moraes). :)

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oi.