Porque é na pele que encontro seu espírito, esse seu silêncio mais profundo, nas dobras da carne sob seus seios, resvalando as costelas quando me oferece as costas (alguma coisa muda), minha mão ganha vida (como se antes de te tocar ela fosse inútil), manejando os dedos pra percorrer e desenhar seu corpo, vejo seu corpo com as pontas dos dedos (está escuro e por isso vejo melhor), decoro cada dobra e ondulação do seu corpo, possuindo à pele que me possui, possuindo seu espírito que me possui, possuindo o momento que me possui, porque é na pele que ele habita, o mais profundo é a pele, oferecendo as lentas contorções de uma dança antiga e poderosa, de fundação da vida (é um renascer quando me movimento ao seu ritmo), e tremem minhas mãos no volume dos seus ossos, e por um momento quero rasgar sua pele, estar dentro, encontrá-la ainda mais nua e mais quente e mais livre, encontrá-la numa linguagem anterior a linguagem, onde não há mal entendido (deveria interromper nesse ponto, mas não), entendo que você não existia (concretamente, conheço a pouco), é como o respirar explodindo nas células e alimentando meu corpo quando seu corpo me acolhe (não sobreviveria ao depois), entendo o antes (concretamente, conheço a pouco), calda esfumaçada que arrasto nas costas (memória) e todas as coisas vivenciadas e abolidas (derrotas, fracassos, insônia ou correr atrás da bola) foram provocadas a priori por esse momento de agora (o momento, claro, é você, não há depois possível), como um feixe magnético me tragando pra junto (é sua pele, tenho certeza), como se alguém planejasse o encontro, desde sempre, como se todo momento anterior respondesse a uma trama, uma longa preparação, que estoura em você (e agora, toda dor antiga fica bonita porque desde sempre é por você que eu sofro), como se fosse ficção, uma narrativa, composta de cifras simbólicas construídas no passado, avançando de forma caótica até tocar seu corpo (dança de fundação da vida), pra ganhar sentindo e abolir sentido outro (confesso, é meio turvo), tocar seu corpo pra renascer, porque é na pele que encontro seu espírito e me encontro na medida em que me perco, e acabo diluído, pacífico, como uma gota azul de tinta num copo d'água, que te ofereço quando termina, mas é só o começo.
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Que lindo!
ResponderExcluirLindo
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