27/04/2011

Retratista sem fundo.

"Machado de Assis falava na 'voluptuosidade do nada', tinha um gozo requintado da frase, gostava de se debruçar sobre as árvores, de ver a baía, de olhar o mar, de se encher da poesia das pequenas coisas. Graciliano Ramos elimina tudo que não seja do homem, da miséria, da condição trágica, de um fatalismo cruel. O seu realismo não se detém na marcha para as descobertas terríveis. Tudo o que ele sente, ele diz. Por isto os seus romances só agradam aos que são difíceis de agradar.

Daí a sua verdadeira grandeza. Os seus personagens não procuram o mistério para se esconder. São, no entanto, instrumentos do mistério, do mais tenebroso mistério que é aquele que é o próprio homem na solidão. 

(...)

É o primeiro caso na literatura brasileira de um homem que não ama a natureza que o cerca. Muito amou Machado de Assis as chácaras da Tijuca, as águas da Guanabara, os arvoredos do Cosme Velho. Vibrava, o velho céptico, com as acácias e as palmeiras dos jardins cariocas.

Graciliano Ramos é um retratista sem fundo."

José Lins do Rego, Dias idos e vividos: antologia. Sel. Org. e estudos críticos Ivan Junqueira. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1981. p. 81-83 IN: Enciclopédia Itaú Cultural - Literatura Brasileira.

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