O legal hoje é ser engraçado.
E todo mundo quer ser legal, logo, todo mundo precisa ser engraçado.
Os perfis de twitter mais “influentes” são de piadistas. Os programas de televisão mais assistidos? programas de humor. Os blogues mais acessados? blogues de humor. Sites de humor. Vídeos no youtube? Sempre os mais engraçados. E-mails? Top dez imagens engraçadas, flagrantes super engraçados, melhores frases de sogra, piadas de são paulinos, corintianos, treinadores e jogadores. Filmes? Comédias românticas, pastiches, mashups, sucesso garantido. O sujeito vai lá e escreve no bio/quem eu sou: “uma pessoa divertida”. Tumblr? Piadas. Paródias. Montagens.
Propagandas? Pessoas (ou quase pessoas), sorrindo. Sempre. Fileiras e fileiras de dentes.
Anúncios? Slogan? Aquela sacada super pegajosa e divertida. Venha se divertir você também.
O legal hoje é ser engraçado.
E todo mundo quer ser legal, logo, todo mundo precisa ser engraçado.
Entre as muitas teorias sobre o que é o engraçado, existem três que são bem esclarecedoras:
“teoria da incongruência: sugere que o humor cresce quando lógica e familiaridade são substituídas por elementos que normalmente não andam juntos. O pesquisador Thomas Veatch diz que uma piada se torna engraçada quando esperamos uma coisa e acontece outra.”
Se você bate na porta do quarto do seu irmão, e atende um elefante azul, se você não desmaiar, você ri. Porque é uma coisa sem lógica. Quarto do seu irmão e elefante azul são dois elementos que não têm qualquer conexão.
“teoria do alívio: de acordo com a Dra. Lisa Rosenberg, o humor, especialmente o humor negro, pode ajudar os trabalhadores a lidar com situações estressantes. Ela diz: 'a ação de produzir humor, de contar uma piada, nos dá uma pausa mental e aumenta nossa objetividade diante da tensão opressiva'.”
Tenho muitos, mas muitos amigos e conhecidos que dizem: “A gente rala, ganha pouco, mas pelo menos se diverte”. Ou seja, manuais de administração e gestão de RH, manter um ambiente agradável, motivação, dinâmicas com papelinhos coloridos e data-show: aprenda em vinte minutos a pegar três ônibus lotados na ida e na volta, aguentar um chefe mala e ganhar um salário mínimo por mês - pausa mental: sorrindo.
“Teoria superioridade: rimos de piadas que focam os erros, a estupidez ou o infortúnio de alguém. Nós nos sentimos superiores a esta pessoa, experimentamos um certo desligamento da situação e assim temos a capacidade de rir dela.”
Bulir com os mais fracos, nada mais é que impor ao outro, à força, o status de piada. Humilhar o outro, materializar a piada no outro, seja por violência física, psicológica, ofensas, é uma maneira de rebaixar o outro a um status inferior para arremeter carências do nosso ego. As causas, claro, são muitas. Carência de ego vai desde incapacidade intelectual (do sujeito que sabe que é burro, e tem por única expressão a agressão) até pinto pequeno, vaidade em suas múltiplas formas, baixa estima em relação à posição social, baixa estima em relação à família, ao corpo, profissão, ocupação, status, frustações acumuladas e suprimidas, enfim, n coisas.
Porque, aliás, "vergonha alheia", é bulir mentalmente. Ou não?
Porque, aliás, "vergonha alheia", é bulir mentalmente. Ou não?
Desde sempre tomamos por engraçado aquilo que julgamos como inferior. As crianças, por exemplo, pobres crianças, encarnam os dois lados da moeda. Por um lado, são tratadas como pequenos adultos, adultos inferiores: “olha, que engraçadinho”, “coitadinho do meu bebezinho”; por outro, educadas para serem nossos palhacinhos: “vai benzinho, faz a dancinha pra mamãe ver”, “fala o palavrão pro titio ver”.
Não sei como as crianças sobrevivem.
Tudo bem. O legal hoje é ser engraçado.
E todo mundo quer ser legal, logo, todo mundo precisa ser engraçado.
Mas às vezes isso incomoda. Quando acontece o milagre de encontrar um sujeito que encarne à carapuça de ranzinza com honestidade, a vontade que eu tenho é de soltar uns foguetes, até rojões, lascar um beijo na testa do sujeito, é quase um êxtase: parabéns, dá aqui um abraço, campeão!
Nem vou tocar em assunto de eleição. Já deu. Já é.
Não sei se isso é coisa de agora, ou se sempre existiu; mas eu, claro, não existo desde sempre; só sei do agora, e agora me parece que o legal é ser divertido, cínico, ironizar. Complicado. Além de ser obrigado, forçado a estar sempre feliz e, principalmente, mostrar-se sempre feliz; você é obrigado a ser engraçadinho, porque ser engraçadinho é ser legal e feliz.
"Vai benzinho, faz a dancinha pra mamãe"
"Vai benzinho, faz a dancinha pra mamãe"
Já dizia o poeta, na elegância do grande clichê que: “rir de tudo é desespero”.
Sei lá se é sinal de desespero; mas que tanta gente rindo, em toda parte - com quê frequência? todo o tempo! é desesperador às vezes, isso é. Tem horas que eu fico elaborando umas hipóteses fictícias para essa coisa. Uma delas, é que os resquícios da maconhada da vovozada-hippie-peladões-oba-oba-vamos-que-vamos contaminou a atmosfera, às nascentes, plantações de arroz e feijão; por causa da ingestão sistemática de THC, estamos sempre chapados; e como essa ingestão é contínua e sistemática, não nos damos conta que estamos chapados.
Pode ser.
Não sei. Talvez não seja coisa de agora. Sei lá, pode ser que Barrabás fosse o bandidão mais divertido da Galiléia.
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Pós-escrito, 16 de Fevereiro de 2011: curioso, hoje, volto a esse post, porque acabei topando com um texto publicado na Folha, por Nina Lemos, em dezembro de 2010, pouca mais de um mês depois que escrevi isso aí: 30/12/2010, "sucesso de quem consegue ser alegre o tempo inteiro"
fonte das citações: Como funciona o riso, por Marshall Brain - traduzido por HowStuffWorks Brasil
dispersed in vacuum, oxygen grilled her eyes. Destruction, death is breathing.
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