“Para ser franco novamente, ainda não comecei minha carreira literária, embora tenha recebido um prêmio. Na minha cabeça debatem-se argumentos para cinco novelas e dois romances. Um deles já foi concebido há tanto tempo que algumas personagens envelheceram, sem terem sido escritas. Tenho na cabeça um exército inteiro de gente querendo sair; à espera apenas da voz de comando. Tudo o que escrevi até agora não passa de bobagem em comparação com aquilo que gostaria de escrever e que escreveria com entusiasmo[...] Não gosto do meu sucesso; os argumentos que estão na minha cabeça sentem ciúmes e despeito por aquilo que já foi escrito; é uma pena que as besteiras já tenham sido feitas e que o bom tenha ficado abandonado num depósito, como os livros velhos. Claro que há muito exagero neste lamento, muito disso não passa de impressão, mas há uma parcela de verdade, uma grande parcela. O que eu considero bom? Aquelas imagens que me parecem ser as melhores, que eu amo e guardo ciosamente, para não desperdiçar e estragar em “O aniversário”, escrito por encomenda... Se meu amor se engana, então eu estou errado, mas é bem provável que ele não se engane! Posso não passar de um tolo convencido, ou, de fato, sou um organismo capaz de ser um bom escritor. Tudo o que se escreve agora não me agrada e me dá tédio, mas tudo o que tenho na cabeça me interessa, me comove, me preocupa – daí deduzo que ninguém faz o que deve, e que só eu conheço o segredo de como se deve fazer. É bem provável que todos os escritores pensem assim. Por sinal, o próprio diabo quebraria os chifres com essas questões...”
Anton Tchékhov, em carta a Aleksei Suvórin, Moscou, 27 de outubro de 1888 In: Sem trama e sem final: 99 conselhos de escrita. Seleção de Pierro Brunello. Tradução de Homero Freitas de Andrade (Editora Martins Fontes, 2007) p. 50
Tenebrox lux. TchÉkhov era um monstro.
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